Sempre
quis ir à Irlanda. Bem, no fundo, como qualquer amante de viagens sempre quis
ir a todo o lado. Mas em relação à Irlanda o sentimento era especial. Queria
comprovar a conotação de “Ilha Esmeralda”, a alegria dos irlandeses, os pubs, a
herança e cultura celta, o berço dos U2, Cranberries, Westlife, Snow Patrol e
muito mais. Acima de tudo fui para me deixar surpreender. Acho que manter as
expetativas não muito altas quando viajamos é importante.
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Rio Liffey |
Cheguei
a Dublin ao final da tarde e à saída do Terminal 1 do aeroporto o rebuliço de
pessoas que queria ir para o centro da cidade era grande. Para nos deslocarmos
para o centro de Dublin, a uma distância aproximada de 10km, as opções são o
autocarro e o táxi. Na categoria de autocarros existem os Airlink, Aircoach e o
Dublin Bus. Seleccionei o Airlink por uma questão económica. O bilhete de ida
são 7 euros, sendo o ida/volta de 12 euros. O autocarro possui wi-fi gratuito e
uma zona específica para as malas no piso inferior. A viagem dura cerca de meia
hora, dependendo do trânsito na cidade.
Saí
naquele que é o coração da cidade, a O’Connell Street. Uma longa e movimentada
avenida de comércio e serviços. A meio desta encontra-se o imponente Spire, um
monumento em forma de agulha com 120 metros de altura.
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O'Connel Bridge |
Depois
de todas as formalidades relativas ao meu hostel ainda fui a tempo de conhecer
um pouco de Dublin. A noite já tinha chegado e muitas das ruas e respetivos
monumentos estavam iluminados pelas cores da bandeira irlandesa. Atravessei o
rio Liffey e estava imediatamente na zona denominada “Temple Bar”, onde se
situa o icónico pub com o mesmo nome e muitos outros. Pouco passava das sete da
tarde e as ruelas daquele bairro estavam apinhadas de gente. Bares em quase
todas as portas e muita música irlandesa na atmosfera. Dublin veio-se a
confirmar como uma cidade excelente para diversão. Não tardei em encontrar,
agora sim, o verdadeiro Temple Bar. Isto porque as fotografias e as poses para
selfies o denunciaram. O pub esbanjava carisma, mas foi-me impossível lá entrar
nessa primeira noite devido à lotação esgotada do local. Tive de me contentar
em apreciar e sentir o espírito festivo daquelas ruas. E que bom foi para
iniciar os meus dias naquele país.
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Temple Bar |
No
dia seguinte acordei cedo, pronto e entusiasmado para caminhar pelos bairros,
ruas, pontes e parques da capital irlandesa. A poucos metros do hostel
encontrei um pequeno e pitoresco parque, enclausurado numa zona residencial, o Blessington
Street Basin. Foi um importante reservatório de água para a zona norte da capital
durante grande parte do século XX e é agora um acolhedor espaço verde, ideal
para breves passeios e observação de aves.
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Blessington Street Basin |
Desci
a O’Connell Street e dirigi-me à Grafton Street, rua pedonal e uma das mais
importantes no que toca a compras e animação de rua. Fiquei alguns minutos a
apreciar um grupo de jovens a cantar um medley de músicas do Ed Sheeran. Ao
longo da rua sentia-se, igualmente, a aproximação das festividades do
Halloween, tradição que tem raízes históricas e espirituais na Irlanda, com
decorações personalizadas e crianças no famoso “Trick-or-treat”.
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Edifício na Grafton Street |
A
Grafton Street culmina naquele que foi para mim um dos pontos altos da viagem,
a descoberta do St Stephen’s Green. Um parque belíssimo e muito fotogénico. Dos
favoritos dos locais para conviver e descontrair da agitação urbana.
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St Stephen's Green |
Ao
redor do parque estão presentes muitos edifícios do estilo gregoriano e é aí
que fui conhecer três museus nacionais, todos de entrada gratuita. O primeiro
foi o de História Natural, mais conhecido por Dead Zoo. Já tinha lido sobre ele
e estava desejoso de o conhecer. O piso inferior era dedicado aos animais da
Irlanda. Como o próprio nome indica, todo o espaço está recheado de vitrinas e
exposições com animais reais embalsamados. A taxidermia como um culto. Se eu já
estava impressionado com este piso, o superior, dedicado a animais do mundo,
foi ainda mais surpreendente. Leões, ursos, lobos, zebras, macacos, pinguins,
focas. De tudo um pouco. Qualquer animal que esteja a imaginar, certamente está
lá presente. Até o já extinto lobo da Tasmânia, ou tilacino, tem lá um
exemplar. Para os amantes da biologia e do mundo animal, este museu é um
autêntico oásis de contemplação.
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Museu de História Natural - "Dead Zoo" |
Mesmo
ali ao lado encontra-se a Galeria Nacional da Irlanda. Antes de lá entrar e em
frente à mesma, visitei mais um parque, o Merrion Square. Muito procurado por
turistas pela presença, num dos seus recantos, da estátua do escritor Oscar
Wilde. Finalmente entrei na Galeria e são precisos largos minutos, quiçá horas,
para ver tudo o que guarda o interior do edíficio. São 54 salas com mais 800
obras de arte. A minha visita foi breve, mas consegui vislumbrar obras de
Caravaggio, Rembrandt, Velázquez, Monet, Picasso, Goya e Van Gogh. A estética
das salas torna também a visita, esteticamente, muito prazerosa.
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Estátua de Oscar Wilde, no Merrion Square |
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Galeria Nacional da Irlanda |
Não
muito longe dali, mais um icónico espaço. O campus da Trinity College. A mais
antiga e prestigiada universidade da Irlanda. A maior atração dentro do campus
é a Old Library, que contém para além de milhares de livros, a harpa mais
antiga do mundo e o Book of Kells, um manuscrito religioso, com mais de mil
anos. Tentei entrar. Repito, tentei, porque a fila para aceder ao seu interior
era extenuante, apesar do preço de entrada não ser acessível. É daqueles
locais, que caso venha a Dublin, compre o bilhete online antecipadamente.
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Campus da Trinity College |
Em
relação aos museus nacionais faltava-me o museu de Arqueologia. Mais um
edifício imponente com um interior recheado de artefactos marcantes na história
e na cultura da Irlanda. É lá possível encontrar objectos da época viking,
celta, da idade média e muito mais. Há até uma secção dedicada ao Egipto. É
redundante afirmar isto, mas quem tem o bichinho e o gosto pela História vai
apreciar muito este museu. Entrada gratuita, relembro.
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Pormenor do chão na entrada do Museu de Arqueologia |
O
dia já ia longo, mas dirigi-me a este do centro da cidade, para conhecer de
perto o grandioso Aviva Stadium, casa da seleção nacional irlandesa de futebol
e recinto no qual recebeu em 2011, a final da Liga Europa entre o FC Porto e o
SC Braga. É na minha opinião um dos estádios mais bonitos que já vi.
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Aviva Stadium |
Voltei
ao centro pela moderna zona de apartamentos das Docklands e caminhei junto à
margem sul do Liffey, em plena hora de ponta, para regressar ao hostel. Isto
sempre acompanhado pela bonita luz de final de dia.
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Docklands |
O
hostel disponibilizava inúmeros panfletos e brochuras sobre tours temáticas em
Dublin e excursões de um dia ou mais para outros locais da ilha. Fiquei a
ponderar sobre uma ida a Belfast, capital da Irlanda do Norte, ou a
Glendalough, nas montanhas a sul da capital, referenciada como o “Jardim da
Irlanda”. A escolha acabou por cair na excursão à cidade de Galway e aos
penhascos de Moher, tudo isto no outro lado da ilha. Esta viagem organizada
teve um custo de 45 euros.
Ainda
era noite e já o autocarro partia para fora da região de Dublin. À entrada do
mesmo conheci um casal de portugueses do Porto, a Camila e o Osvaldo. Tão bom
ter companhia portuguesa inesperada. Um abraço para vocês caso estejam a ler
este texto. O dia amanheceu muito cinzento e a ameaçar chuva. Contudo dava já
para contemplar o verde de perder de vista da paisagem.
Ao volante, o motorista
Damian serviu-nos de guia sempre com um toque de humor corrosivo. “I’m a
sarcastic bastard!”, foi assim que se apresentou ao grupo. Ia contando
estórias, piadas e descrevendo a paisagem, sempre de uma maneira pouco cordial,
mas que animou muito a comitiva que transportava. Tentou ainda ensinar-nos
frases em gaélico, língua oficial do país, a par do inglês. Sem sucesso. É uma
das línguas mais complicadas de aprender e compreender, consta-se. Como
exemplo, Dublin, em gaélico, denomina-se de Bhaile Átha Cliath. Acho que aqui
já dá para ter uma noção da dificuldade. Apesar de tudo, nas últimas décadas
tem havido um esforço para que a língua ganhe mais força. Exemplo disso é a
presença dos dois idiomas em tudo o que é sinalética.
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Rua de Dublin |
Fizemos
uma breve paragem no coração geográfico da ilha, a cidade de Athlone, que é
banhada pelo Shannon, o maior rio do país. Quase três horas após o início da
viagem chegámos a Galway, a quarta maior do país. A primeira impressão foi de
que era uma cidade muito mais pequena que Dublin, mas com uma alma mais irlandesa.
Percorremos as bonitas ruas, novamente apinhadas de pubs, restaurantes e
pessoas. Visto ser sábado, junto à catedral decorria o mercado semanal, onde se
vendia desde produtos frescos, a flores, artesanato e discos de música celta. A
visita à cidade, infelizmente, foi curta, mas deu ainda para admirar em plena
rua um bonito espetáculo individual de sapateado irlandês, o Riverdance.
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Galway |
Partimos
de seguida, através do parque nacional de Burren, até aos penhascos de Moher. A
viagem até lá foi demorada, mas acima de tudo atribulada e pouco recomendada a
estômagos sensíveis. O nosso novo motorista, Richie, que tomou conta do grupo desde
Galway, advertiu: “ Get ready for a rollercoaster!”. Comprovou-se. As estradas
tornavam-se estreitas, ondulantes e com curvas apertadas. Tudo isto aliado a
uma condução demasiado ousada para meu gosto. A majestosidade da paisagem
amenizou o quase enjoo. Passámos junto do Dunguaire Castle, num local, que
Richie afirmou ter sido atingido por um maremoto em 1755. O mesmo que dizimou
Lisboa, rapidamente conclui. Muito perto dali, a estrada levou-nos até a uma
pequena localidade chamada Lisdoonvarna, conhecida por sediar variados
festivais, sendo mais conhecido o festival anual do Matchmaking, que se realiza
em Setembro, onde homens e mulheres solteiras de todo o país vêm à povoação tentar
encontrar a sua cara-metade.
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Panorama do Parque nacional de Burren |
Finalmente
chegámos aos Penhascos de Moher. Surpresa minha foi encontrar dezenas de
autocarros de turismo na zona, o que demonstra que o local não foge já à
massificação turística. Até mesmo naquele local ermo, é possível encontrar as
típicas lojas de souvenirs. Em relação aos penhascos propriamente ditos, são um
espetáculo da natureza. Observá-los e percorrê-los é uma experiência que tem
tanto de arrepiante, como de memorável. A neblina persistente tornava as
falésias ainda mais místicas. O que igualmente impressionou foi o não
cumprimento das regras de segurança por parte de muitos visitantes, que
arriscavam cair 214 metros até ao mar para ter os melhores ângulos para as suas
fotografias.
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Penhascos de Moher |
O
nevoeiro denso tomou conta do local e visto ser hora de almoçar, páramos na
pitoresca localidade de Doolin. À saída e antes de passarmos novamente por
Galway percorremos uma estrada marítima com panoramas de cortar a respiração.
Ao longo dela fizemos uma breve visita às “Baby cliffs”, uma paisagem que mais
parecia saída da lua. A seguir, passámos por locais onde se gravaram cenas da
série Game of Thrones e tentámos ainda visualizar os famosos leprechauns,
figuras lendárias do imaginário folk irlandês.
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Doolin |
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Baby Cliffs |
A
noite já havia caído e regressámos a Dublin, onde terminou assim a excursão. A
Camila e o Osvaldo tinham voo no dia seguinte, portanto era hora de despedida,
mas com a promessa de reencontro futuro, quem sabe, novamente, na Irlanda.
Eu
tinha ainda um último dia completo para desfrutar. A manhã estava cinzenta e
chuvosa, mas isso não me demoveu de ir conhecer as duas catedrais medievais
mais icónicas de Dublin: Christchurch e St Patrick. Muito perto dali situado
estava o Temple Bar e finalmente lá consegui entrar. Estive dentro do espaço
largos minutos a assistir a um ambiente festivo, marcado pela música e por
muitas pints de cerveja Guiness.
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Interior do Temple Bar
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Christchurch |
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St Patrick's Church
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Durante
a tarde, aconteceu mais um dos pontos altos da viagem. A visita ao extenso
Phoenix Park. Sublinho, é mesmo grande! Muito maior que o Central Park de Nova
Iorque, por exemplo. Entretanto, o estado do tempo tinha melhorado e a luz da
tarde tornou a experiência ainda mais bonita. As cores de outono pintavam as
árvores do parque e foi possível contactar com dezenas de veados que por lá pastam
livremente.
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Phoenix Park |
O
anoitecer já não tardava, mas queria ainda visitar o cemitério Glasnevin e os
Jardins Botânicos, na zona norte da cidade, já desviados de Phoenix Park.
Cheguei ao cemitério, o maior da cidade, através de um canal fluvial, por onde
muitas famílias passeavam naquela tarde de domingo. Escolhi visitar Glasnevin
porque tenho particular interesse pelo turismo negro e valeu bem a pena a
caminhada para lá chegar. O cemitério é o maior da cidade e consta que estão
enterradas nele mais de 1,5 milhões de pessoas, muitas delas vítimas da fome
que abalou o país em meados do século XIX. Curiosamente existe um memorial aos
famintos desse período na zona central de Dublin, junto ao rio.
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Famine Memorial |
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Cemitério Glasnevin |
Apesar
de serem adjacentes ao cemitério já não tive oportunidade de visitar os jardins
botânicos. De regresso ao hostel foi bonito observar a lua cheia surgir por
detrás do imponente Croke Park, outro estádio icónico da cidade e do país.
O
dia de regresso a Portugal finalmente chegou e só poderia sair de coração cheio
e alma feliz por aqueles dias na Irlanda. Ficou ainda muito por ver. Para além
da biblioteca no Trinity College, não tive oportunidade de conhecer outros
ex-líbris de Dublin, como a fábrica da cerveja Guiness, Dublinia (experiência
viking) ou a prisão de Kilmainham Gaol.
Dublin
é uma cidade jovem, cheia de vida, com personalidade e muito que ver. Tanto a
nível monumental (museus, igrejas e outros edifícios) como a nível ambiental
(múltiplos jardins, parques e cursos de água). Conhecer a Irlanda é uma
experiência que marcará certamente a vida de todos aqueles que a visitam.
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Convention Center |
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